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Entrevista com Mona Damluji e Innosanto Nagara, autores de JUNTOS

paula18365

Atualizado: 14 de mar.


JUNTOS é o primeiro lançamento da Piu em 2025. Uma obra lúdica e poética que celebra o poder do coletivo e convida os leitores a trilharem um caminho de união, amor e esperança. Mona Damluji é a autora do texto poético, originalmente escrito em inglês (que na nossa edição tem tradução da também poeta Paula Taitelbaum) e Innosanto Nagara, que como Mona vive nos Estados Unidos, é autor das ilustrações. Conversamos com eles sobre processo de criação e o lançamento da obra no Brasil. Confira aqui o papo:

 



Mona Damluji nasceu nos EUA, de uma família de origem árabe. É poeta, professora universitária, produtora de cinema e ativista cultural. Nos projetos em que se envolve, sempre apresenta um olhar solidário, justo e moderno em relação aos imigrantes e aos grupos historicamente excluídos. JUNTOS, em parceria com Innosanto Nagara, foi sua estreia na literatura infantil.


Piu: Qual foi sua maior inspiração para criar JUNTOS?

Mona: JUNTOS é um livro que abre nossos olhos para as muitas maneiras pelas quais a ação coletiva transforma o mundo ao nosso redor. Começo observando o ambiente em que vivemos e levo essa ideia para a forma como a coletividade pode moldar nossas comunidades e construir um mundo mais justo. Fui inspirada a escrever este poema por um grande amigo, o falecido ativista americano Ady Barkan, que viveu por sete anos com ELA (Esclerose Lateral Amiotrófica). A doença degenerativa tirou de Ady a capacidade de falar, mas em um de seus últimos discursos usando sua própria voz, ele disse “quando falo sozinho, minha voz é fraca, mas quando falamos juntos, somos imparáveis”. Sendo mãe de duas crianças pequenas, fui motivada a levar essa ideia tão importante para uma linguagem que fizesse sentido e despertasse a curiosidade dos jovens leitores. Também escrevi pensando nos adultos que leem com as crianças, como uma afirmação de valores e do compromisso com a justiça social, além de celebrar o poder das pessoas quando se unem.

 

Piu: JUNTOS é um livro ilustrado no qual o texto e as imagens se complementam. Como foi o processo criativo? Você e Innosanto trabalharam juntos desde o início ou você escreveu o texto primeiro e depois ele ilustrou? Vocês já se conheciam antes dessa colaboração?

Mona: Desde o início, o processo criativo foi colaborativo e baseado num compromisso que compartilhamos que é o de trazer as crianças para o debate e para os espaços comunitários. Escrevi a primeira versão do poema e compartilhei com Inno, pedindo sua opinião e perguntando se ele se interessaria em ilustrar o livro. A partir daí, trabalhamos juntos para ajustar a sequência das imagens e pensar em formas de incorporar diferentes perspectivas internacionais, destacando lutas por justiça social e ambiental ao redor do mundo.


Piu: JUNTOS foi sua estreia na literatura infantil. Como é saber que crianças de outros países, como o Brasil, terão acesso ao seu trabalho?

Mona: É uma honra ver meu primeiro livro infantil traduzido e chegando aos leitores no Brasil! Espero que as imagens e ideias de JUNTOS ressoem tanto para as crianças quanto para os adultos que leem com elas.

 

Piu: Antes das ilustrações, você já tinha em mente que o livro mostraria diferentes etnias e culturas, incluindo povos indígenas da Amazônia?

Mona: Sim, e foi exatamente por isso que procurei o Inno. Ele é o ilustrador ideal para o livro. Nós dois compartilhamos a visão de que, mesmo que a maior parte do poema não cite países ou comunidades específicas, as ilustrações poderiam ampliar essa mensagem, celebrando comunidades indígenas e locais pouco representados na literatura infantil global — da Amazônia à Palestina, passando pelos Estados Unidos. Nesses lugares, há muito a aprender com as lutas históricas contra injustiças sociais e ambientais.

 

Piu: Você já conhece o Brasil? Se não, que impressão tem do país?

Mona: Ainda não tive a chance de visitar — mas está no topo da minha lista de lugares que quero conhecer! Tenho muitos amigos que são brasileiros ou que passaram bastante tempo por aí, e tudo o que aprendi com eles, além dos meus estudos em cinema e mídia, me dão a impressão de que todo mundo deveria passar um tempo conhecendo a sociedade brasileira. A cultura, a história, a biodiversidade, a música, o cinema, a dança, a gastronomia… tudo me fascina!



Innosanto Nagara nasceu e cresceu na Indonésia e mudou-se para os EUA em 1988 onde vive até hoje. Ativista dos direitos civis e ambientais, acredita e coloca em prática que “a união faz a força”. É autor de "A de Ativismo", considerada a primeira obra infantil que aborda justiça social para as crianças e na qual lançou seu estilo inconfundível de ilustrar.

 


Piu: JUNTOS é um livro ilustrado onde o texto e as imagens se complementam, tornando a mensagem ainda mais forte. Como foi o processo de criação das ilustrações?

Innosanto: JUNTOS foi o primeiro livro que ilustrei sem ter escrito o texto, então foi muito importante garantir que minha visão estivesse alinhada com a da Mona. Eu já queria ilustrar um livro infantil sobre ação coletiva há um tempo, mas ainda não tinha encontrado o texto certo. A Mona acertou em cheio, valorizando tanto o indivíduo quanto a coletividade. Além disso, sendo um poema, abriu espaço para brincarmos com diferentes interpretações visuais de cada linha. Então, nos divertimos bastante. Basicamente, começamos com uma planilha onde trocamos ideias relacionadas a cada tema. Depois, discutimos representações visuais para essas histórias. E, finalmente, olhamos toda a coleção de histórias visuais, buscando equilíbrio e representação. Apropriadamente, o processo foi totalmente coletivo.

 

Piu: Seu estilo de ilustração é bem único e vibrante. Como escolheu as cores e formas para transmitir a mensagem de união e colaboração no livro?

Innosanto: Obrigado! Eu começo as ilustrações em preto e branco no computador. Às vezes, desenho primeiro no papel, mas rapidamente traço e digitalizo. Gosto de trabalhar com linhas precisas no computador porque nunca fico satisfeito com o que faço no papel. Dessa forma, posso ajustar e reajustar detalhes menores repetidamente até que cada linha fique perfeita. Depois, levo a arte linear para um programa de edição de imagens, onde adiciono cor, textura e iluminação para criar a vibração que você mencionou. Quanto às cores e formas, isso é muito guiado pelos próprios temas. Às vezes, faço uma escolha e então preciso acabo voltando atrás para ver o que os espectadores já viram demais e o que ainda está faltando. Mas, na maior parte, é um processo orgânico de observação.

 

Piu: Qual o significado do sapo, que aparece em todas as cenas do livro?

Innosanto: Nos meus livros infantis, gosto de incluir elementos que envolvam tanto as crianças quanto os adultos. Bons livros infantis são aqueles que as crianças leem repetidas vezes (e repetidamente). Para deixar meus livros divertidos, incluo surpresas que elas podem encontrar a cada nova leitura. Algumas, elas vão perceber imediatamente. Outras, se tornarão insights em algum momento no futuro. Esses também são livros que os adultos lerão com as crianças em suas vidas muitas vezes (e repetidamente). Então, quero que haja camadas para eles também. Uma camada para interagir com as crianças. E uma camada para seu próprio insight e apreciação. Ter um animal em cada página é uma dessas camadas para os mais jovens. Em A de Ativista, era um gato. Em Counting on Community, era um pato. Em JUNTOS, os leitores procuram o sapo. Meus estudos formais foram em zoologia. Sapos são uma "espécie indicadora", cuja saúde reflete a saúde de nossos ecossistemas. Mas, no fim das contas, sapos são fofos e as crianças gostam de sapos.


Piu: Quais foram os maiores desafios ao ilustrar JUNTOS? Houve alguma cena ou conceito que foi particularmente difícil de traduzir visualmente?

Innosanto: Sempre tivemos várias ideias para cada conceito, então acho que o maior desafio foi decidir qual escolher. Provavelmente, tenho mais orgulho das ilustrações que têm várias camadas de história. Por exemplo, "Uma onda vem e deixa o surfista contente..." poderia ter sido algo mais metafórico, mas decidimos ir com um surfista mesmo. No entanto, a cultura do surfe tem suas próprias complexidades e relações problemáticas envolvendo as comunidades com as quais interage. Mas muitos também encontram empoderamento e relacionamentos positivos por meio do esporte. Um amigo meu na Indonésia, Riri Riza, é um diretor de cinema que recentemente fez um filme muito interessante sobre uma garota que queria se tornar uma surfista profissional (Kulari Ke Pantai). Era sobre a garota, mas também sobre papéis de gênero, classe e diversidade cultural no leste da Indonésia. Enquanto isso, a Mona me contou a respeito de um documentário sobre um clube de surfe em Gaza. Era sobre os surfistas, mas também sobre como coisas que muitos de nós consideramos garantidas fazem parte da história de resiliência e resistência no contexto da ocupação e do genocídio. Então, no final, a imagem é de uma criança surfando, mas o cenário é a Palestina.


Piu: Você já tem outro livro publicado no Brasil. Qual é a sua impressão sobre o nosso país?

Innosanto: Nunca estive no Brasil, mas espero que um dia eu possa ir. Tenho vários amigos brasileiros que conheci através de trabalhos de solidariedade com movimentos sociais e ativismo ambiental. Sendo originalmente da Indonésia, sinto que temos muito em comum. Dois países enormes com uma incrível diversidade cultural e natural. Ambos têm uma longa história de colonialismo cujo legado ainda molda nossas lutas hoje. E, apesar dos papéis políticos, econômicos e ecológicos globais que nossos países desempenham, voamos um pouco abaixo do radar em relação ao Ocidente. O que talvez seja uma coisa boa.

 


 
 
 

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